25 de maio de 2020

J. B. de Oliveira Sobrinho

Assim ele assina. Fez a TV no Brasil e muito já se escreveu sobre ele. Lá na frente muitas biografias serão publicadas. Afinal trata-se de um gênio da raça. Guardo a impressão de que a qualquer coisa que se dedicasse a faria grandiosa. Sagacidade, cultura, inteligência e senso de oportunidade. Antes de voltar aos problemas atuais da TV no Brasil vou me deter em alguns artigos sobre esse personagem raro na cultura brasileira. Se por acaso um dia ele aparecer no seu caminho se prepare: que suas primeiras palavras sejam breves, inteligentes e apropriadas para o momento. Do contrário ele passará como um raio. Entende não só de TV. Bem informado, antenado com os novos tempos da comunicação e amigo dos seus amigos sabe também tudo de vinhos, de voos, de comida, de gente e de remédios. 

O Boni é assim. Para deter sua atenção é preciso perspicácia, profundo senso de abordagem, formulação correta e poder de síntese. Do contrário ele não abrirá a boca. Pode beirar a antipatia. Mas se ele aquiescer com certeza você terá uma conversa inteligente. Para provar o que escrevo nesse preâmbulo busquei nos meus alfarrábios um exemplar de como formulou e implantou uma das maiores redes de TV do mundo. Nos arquivos da Globo existem milhares deles. Guardei um. Claro que a Rede Globo de hoje não chega nem perto da TV que o Boni implantou. Talvez pela falta dele esteja numa escalada que ninguém sabe onde vai parar.

 Administrava a Globo através de memorandos internos tal o exército de gente que seguiam rigorosamente suas determinações. Formou gerações de excelentes profissionais. Trabalhei na TV Globo duas vezes: a primeira no começo e depois nos anos 80 do Século passado. Só vim a privar de alguma intimidade muitos anos depois. Um dos meus melhores amigos era seu amigo. O tratava como BONIFÁCIO. Uma das minhas melhores amiga era amiga dele. Por isso dividimos a mesa muitas vezes. Trata-se de um sujeito espirituoso e genial e de personalidade exuberante.

 Se dúvida do que escrevo nestas linhas detenha-se em um dos seus inesquecíveis MEMORANDOS que transcrevo abaixo. Muito interessante. Esse aqui posto é dos anos 70 do Século passado. Ao final você saberá como ele formou gerações de excelentes profissionais. Esse Memorando a que me refiro foi reeditado no ano de 2003 já no final de sua era na Rede Globo. Para os dias de hoje é um primor. Vale como uma pós-graduação em comunicação. Transcrevo:

     INFORMAÇÃO PELA TV- Dez Princípios básicos

  1. Responsabilidade- Não informar sem apurar. Ser sempre equilibrado e equidistante. Não distorcer. Não favorecer. Nunca falsificar, jamais enganar. Entender a responsabilidade social e política de um veículo de massa.

  1. O abc da informação-

  1. Quem dá informação em primeira mão e com frequência cria hábito.
  2. Quem cobre melhor e com isenção cria credibilidade
  3. Quem usa linguagem simples e coloquial comunica-se.
  4. Quem analisa causas e suas consequências cria interesse.
  5. O hábito, a credibilidade, a comunicação e o interesse criam prestígio.


  1. Conteúdo- Uma mera informação ou um grande evento necessita de pesquisa. Até um simples jogo de futebol necessita de estudo prévio. Preparação é fundamental. Evita gafes, acaba com o falatório inútil e enriquece a cobertura. Sempre que um assunto exigir um especialista não hesite em convocar o que se comunica melhor e de forma mais coloquial. Não tente suprir a ausência de quem sabe mais. Quando improvisar não esqueça que um texto falado pode ser tão bom quanto um texto escrito.

  1.  Finalizar- A continuidade (suíte) é fundamental. Um grande acidente não termina no local, continua no hospital e na casa das vítimas, na apuração de causas, etc. Uma denúncia tem que ser acompanhada até a solução. Fatos de qualquer natureza, só devem ter sua cobertura encerrada quando estiver extinto e completamente resolvido, mesmo ao longo do tempo. Na televisão o hábito do capítulo e da série está arraigado, exigindo esse comportamento.

  1. Imagem e Som- Televisão é imagem. Quem posiciona melhor suas câmeras e tem imagens mais próximas e mais variedade de imagens tem mais chance de ter preferência na audiência. O som é mais difícil de captar do que a imagem. As ondas sonoras são lentas e a luz (imagem) mais rápida. O som precisa ser captado de perto e com microfones bem posicionados. Boa captação de som é um grande diferencial de qualidade na cobertura.

  1. Eventos- Eventos jornalísticos ou esportivos tem que ser tratado como espetáculo. Devem ser utilizados recursos artísticos e toda tecnologia possível: criatividade na transmissão, pesquisa de texto, mobilização de recursos humanos, música, luz e efeitos especiais.

  1. Confiabilidade- Todos os eventos ao vivo necessitam de proteção e pré-produção não só para aquecer o evento como suprir eventuais panes de transmissão.



8-Aparência- Homens e mulheres devem estar asseados e com cabelos bem penteados. Homens com barba feita e mulheres com penteados discretos. Mesmo no jornalismo há espaço para personagens e tipos, mas se esse não for o seu caso é melhor manter a sua forma física.



9-Guarda-Roupa- Para não desviar a atenção da informação o vestuário deve ser absolutamente neutro. Nos homens terno sóbrio e bem cortado, com camisa e gravata lisa ou no mínimo listras discretas. Nas mulheres uso de blusas sem estampas de qualquer tipo sem detalhes e golas exageradas, não usar blusas colantes. Broches e enfeites são proibidos. Brincos são permitidos desde que pequenos e sem cores. Nos programas esportivos e informais, camisas e camisetas não podem ter logotipos ou grifes, salvo da própria emissora.

10- Convicção- Não colar na frente do publico. Listas e nomes não decorados devem ser lidos em off. No caso de necessidade absoluta de leitura, usar uma ficha com o nome da emissora servindo de apoio. Nesse caso a leitura deve ser ostensiva e não disfarçada. É importante ter a ficha de apoio sempre à mão. O microfone não deve ser empunhado como um martelo, mas elegantemente. No estúdio ou na rua relate apenas. Passe para o público que e conhece o assunto.

Essa TV não existe mais.

Um comentário:

  1. Aleluia sempre impecável em seus comentários.
    Padrão Globo de Televisão era exigente mas perfeito.Os comerciais tinham que obedecer todas as normas ou seriam rejeitados.HOJE CADA UM GRITA MAIS QUE O OUTRO.Temos que ficar com o controle na mão para não estourar os tímpanos.Como fazem falta o Boni e Walter,sabiam fazer uma televisão de qualidade.

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