21 de setembro de 2012

UMA LEI PARA A INTERNET (IV)

Em qualquer lugar do mundo civilizado, o empreendedor que monta seu negócio é o responsável por ele e responde pelos efeitos e ações da empresa criada, em todos os níveis, desde o trabalhista ao fiscal, pela tecnologia, se for o caso, e pelos serviços prestados. Toda empresa tem um endereço, uma sede, um local e deve estar legalmente registrada na junta comercial e no Brasil, numa dezena de repartições burocráticas de inúmeros órgãos dos governos Federal, Estadual e Municipal. Sua sede poderá ser em qualquer lugar do mundo, mas para atuar no mercado brasileiro terá que se estabelecer. Do ponto de vista fiscal, não há gênio sobre a terra que seja capaz de burlar o gigantesco emaranhado de normas, leis, decretos e portarias que espreitam os empreendedores do mundo real. Qualquer empresário, em qualquer nível, sabe essa lição de cor e sente em suas atividades o peso da pata do Estado brasileiro.

Já na internet, no chamado mundo virtual, é diferente. O sujeito se estabelece na China, na Etiópia, no Camboja ou sabe Deus onde e endereça um site de vendas para o mercado brasileiro. Eles não estão estabelecidos aqui, mas podem vender à vontade no nosso mercado. Se ele vende mercadorias no valor de até quinhentos dólares e a entrega é providenciada pela nossa Empresa de Correios e Telégrafos, a EBCT, (ainda há telégrafos?) o comprador estará obrigado a pagar sessenta por cento sobre o preço da mercadoria, somado mais o custo de transporte e do seguro de envio, se houver, no ato de retirada na agência dos Correios. Se o valor do produto for superior a quinhentos dólares, o comprador pagará os mesmos sessenta por cento, mas deverá preencher uma guia, chamada pela Receita Federal de Declaração Simplificada de Importação, depois de identificar e imprimi-la no site da Receita. Por esse método, qualquer um pode comprar em sites no exterior no valor de até três mil dólares. Acima desse valor, você ,comprador, já será considerado pela Receita Federal não um consumidor, mas um importador e aí terá que possuir um cadastro de importador devidamente registrado na Receita ou procurar um despachante aduaneiro, nome que se dá aos escritórios credenciados pela Receita Federal para facilitar sua vida junto ao governo no momento que desejar fazer qualquer importação. Coisa bem burocrática. Uma teia, justificada pelos legisladores pela intenção de proteger a indústria nacional, quando nacional hoje é só o que vem da terra, o que é plantado. Porque o resto está globalizado. Cada pedacinho vem de um canto do globo. E o pior: muitos produtos, mesmo depois de toda essa burocracia e de todos os impostos pagos, ainda ficam mais baratos que o chamado produto nacional. O Estado brasileiro sempre primou pela tentativa de controlar tudo que vem de fora com o argumento de proteção à indústria nacional. Durante anos, criou-se um aparato de métodos nos portos, aeroportos e fronteiras para flagrar bagulhos e badulaques que todo tipo de passageiro trazia do exterior. Quando a máquina já não mais respondia, partiu-se para a política de taxação. Basta olhar os preços dos automóveis fabricados e vendidos aqui. O mesmo automóvel que é exportado chega a custar no exterior a metade do preço. Se comparados com os preços do mercado americano,então, é um Deus nos acuda. Enfim, o Estado brasileiro sempre primou em andar por uma via em que a competitividade, a produtividade, a modernidade e a funcionalidade ficavam num segundo plano. Hoje já não é mais assim. O mundo virtual exige uma nova postura não só do consumidor como do Estado e, por consequência, das autoridades legislativas e executivas. A sociedade brasileira não está dando a devida atenção a esse Marco Civil da Internet.

Mas existe outra modalidade de site de lojas e empresas no exterior, principalmente, as grandes lojas de departamento americanas. Estas possuem sites em português, algumas estão estabelecidas no Brasil, e os preços dos produtos são anunciados já com os impostos inclusos. Você receberá em sua casa a mercadoria sem nenhum contratempo com a Receita Federal. Mas é preciso certificar-se da idoneidade do site. Aconselha-se telefonar para vários órgãos para confirmar que o consumidor não estará sendo enganado. Mas o brasileiro não gosta dessa “via sacra”, entre a burocracia e a pesquisa, ele prefere arriscar-se diante do atraente. E na Rede tem todo tipo de engodo. É necessário que estejamos sempre atentos. Enquanto não existir uma lei específica, o fiscal terá que ser cada um de nós em defesa do próprio bolso.

Falta-nos uma entidade, uma agência reguladora que fixe normas, parâmetros e métodos de atuação no mercado virtual e também uma entidade fiscalizadora. O aparato legal existente não contempla todas as possibilidades do mundo virtual. São cada vez em número maior os reclamantes nos Procons e no Juizado de Pequenas Causas diante das falcatruas das lojas na Rede

11 de setembro de 2012

UMA LEI PARA A INTERNET (III)

Conflito e confusão não faltam na ausência de uma Lei para a internet no Brasil. IP quer dizer Identificação Pessoal do seu computador. Cada computador tem um número e através dele você jamais estará incógnito na rede. VoIP significa o tráfego de voz ou uma ligação telefônica feita por computador que hoje pode-se realizar gratuitamente através de serviços como o Skype. Acontece que as teles torcem o nariz e não gostam nem um pouco dessa história.

Por elas, esse tipo de serviço deveria ser pago também. Isso para não falar em aplicativos como o VIBER em que você consegue falar através de ligações gratuitas para qualquer lugar do mundo, desde que seu interlocutor tenha baixado no seu celular o mesmo aplicativo, e enviar SMS na quantidade que desejar. Tudo isso sem pagar um tostão a ninguém. Existem dezenas de aplicativos como esses no mercado. É uma briga de gigantes que nem a Anatel, Agência Nacional de Telecomunicações, órgão criado pelo governo para ser a agência reguladora do setor de telecomunicações no Brasil, consegue resolver.

Permanece, exatamente como foi durante muitos anos, a dúvida de quem iria cuidar dos jacarés brasileiros. Como ele é anfíbio, os legisladores das primeiras normas ambientais, em meados do Século XX, esqueceram-se de definir quem iria cuidar do bicho. E ficou a confusão: era o setor que cuidava de florestas ou o que cuidava do setor aquático? Com a importância que o meio ambiente, como um todo adquiriu nas últimas décadas e as atualizações realizadas nas leis e normas ambientais, o jacaré acabou por encontrar proteção específica no IBAMA, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente.

Com a internet não esta sendo diferente. Os ajustes realizados pelo relator do projeto, o Deputado Federal Alexandre Molon (PT-RJ), e que tramita no Congresso Nacional em Brasília com o nome de Marco Civil para a Internet, foi acrescentado ao texto algo como “neutralidade na rede”, em que nenhuma empresa poderá diferenciar serviços e usuários na rede”. Isso se refere, entre outros assuntos, às operadores de telefone que tentam e conseguem colocar dificuldades no uso do sistema de trânsito de voz sobre IP para celulares. Tudo isso, como expliquei acima, porque o serviço é gratuito.

Essas questões foram abordadas em matéria assinada pelo jornalista Danilo Fariello, a partir de Brasília, pelo jornal O Globo, do Rio de Janeiro, na sua edição de 12 julho de 2012, no Caderno de Economia, página 26. A quem caberia mediar, ajustar e deliberar sobre tais conflitos? Perguntou a matéria do jornal O Globo.

No próprio Congresso Nacional há quem defenda que este assunto fique a cargo da Anatel. Outra corrente defende que o assunto fique na órbita do Conselho Gestor da Internet no Brasil, o CGI.br que a exemplo de todos os países do mundo, possui um conselho gestor para a internet. O nosso foi criado no ano de 1995 e reúne iniciativas ligadas ao setor com a participação do governo, empresas, gente do terceiro setor e especialistas.

Nos ajustes realizados pelo Deputado Molon como relator do Marco Civil para a Internet o governo defende que o CGI tenha menos poder de que anteriormente lhe foi atribuído na versão que partiu do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas, a FGV, do Rio de Janeiro. Por este Centro, nas palavras de seu técnico Bruno Magrani o CGI deveria atuar como órgão consultivo. Na ocasião o Deputado Molon declarou ao repórter Fariello que iria defender “ um papel para o CGI mais preciso, de forma que não se possa alegar que ele vai avançar para além do seu papel”. Ora, esta declaração do Deputado não quer dizer nada, mas pode muito bem ser entendida como a defesa de mais poder para a Anatel como deseja o Executivo Federal. O Deputado Molon conclui na mesma matéria publicada pelo jornal observando que o texto final traz novidades “também para garantir mais transparência dos termos de uso dos provedores e normas menos controversas para a remoção de conteúdo a pedido de pessoas, que por exemplo, se sintam caluniadas por informação disponível na rede”.

O Deputado Molon concluiu seu parecer e iria encaminhar o projeto para votação em plenário no final de julho passado. Mas veio o recesso do Congresso Nacional acompanhado das campanhas para as eleições municipais de outubro, dia 7, de 2012. Até lá não haverá quorum para se votar nada no Congresso.

De tudo que li e pesquisei sobre as contribuições que foram incorporadas ao Projeto de Lei conhecido como Marco Civil da Internet para ele serão destinados todo tipo de delito na rede. Fica difícil conceber numa mesma Lei as penalidades previstas para assuntos eminentemente técnicos, como é o caso do VoIP, a reclamações sobre sites de compras. Alguns destes defendem abertamente que eles não devem ter um telefone disponível para os usuários pois não se encaixam na prática de prestadores de serviços. Se um site de compra e venda não se considera um prestador de serviço é necessário que exista um artigo de uma Lei, específico, sobre este assunto para que o consumidor não fique ao Deus dará como se encontra atualmente nesse caso.

Esse é apenas mais um aspecto a merecer do Congresso Nacional mais atenção e mais estudos e uma busca de contribuições mais abrangente antes da votação do Marco Civil. Pelo andar da carruagem o projeto será alcançado por aqueles grupos de poder na área empresarial e por outros que conhecem os escaninhos do Congresso na hora de defender seus interesses.

A imensa parte da população, aquela que é apenas usuária dos serviços continuará dependendo do entendimento genérico do Poder Judiciário para se defender se por acaso tiver seus direitos violados. E necessitará também de um bom advogado para esquadrinhar leis e códigos em busca de enquadramento para a sua queixa.