2 de junho de 2010

O MODELO DO NEGÓCIO (I)

A quem não é do ramo soa um pouco estranho todo esse imbróglio da luta entre a Internet e a mídia tradicional. Quem não está familiarizado com o assunto, custa mesmo a entender. Ainda mais quando se depara com informações que dão conta do faturamento cada vez maior da TV, no mundo da publicidade. E mais, o telespectador não se interessa e nem sempre dispõe de informações para avaliar a queda de audiência, a tiragem de jornais e revistas, impressos, e muito menos a audiência de seu programa favorito de rádio. E nem teria porquê. Esse assunto só é acompanhado com rigor, especialmente, por três seguimentos: publicidade, patrocinadores e gestores do negócio. Há outros interessados, como profissionais do ramo, institutos de pesquisa e curiosos. Mas é ínfima, insignificante mesmo, a parte da população que tem noção de como funciona esse mundo. Mas é muito interessante mesmo. É difícil de explicar. Se a TV perde audiência, se os jornais diminuem cada vez mais suas tiragens, se as revistas cada vez vendem menos e as rádios vêem a cada dia a circunscrição de seu território de audiência, como pode então os números que eles apresentam a cada ano com um faturamento cada vez maior. Isso é difícil de entender mesmo, até para os iniciados. Chega a ser um espanto. Um negócio que diminui a cada dia apresenta a cada ano faturamento cada vez maior. Mas isso é verdade e só é possível graças ao modelo do negócio. O negócio da comunicação nasceu e sobrevive sobre dois pilares básicos, seja jornal, revista, rádio ou TV. No caso dos dois primeiros quanto mais vendem exemplares mais publicidades podem angariar, pois todo aquele que se interessou pelo exemplar teoricamente vai se interessar pela publicidade inserida. Ou, no mínimo, se informar sobre o produto. Como o preço exibido na capa não paga nem um terço de seus custos, a publicidade ou o comercial lá inserido é seu alimento principal. No caso daqueles produtos que são distribuídos gratuitamente, o comercial ou a publicidade é mais fundamental ainda. Se não há publicidade, alguém está financiando ou bancando integralmente o veículo de comunicação. No caso da TV e do rádio vale o mesmo principio só que medido pela audiência, ou seja, o número de pessoas que assistem à programação do veículo. Quanto mais gente assistindo a programação mais caro vai custar os segundos para veiculação de comerciais e mais interessados existirão em inserir sua publicidade. Esse desenho é válido para todos os veículos de comunicação gratuitos ou pagos. É assim desde os primórdios da imprensa ou da comunicação. Primeiro essa mecânica era impulsionada pelo corretor, aquele que ia atrás do interessado em publicar seus anúncios no veículo escolhido. Por essa intermediação ele era remunerado com uma comissão previamente acordada com o dono do veículo. Depois, aí na primeira metade do século XX, surge entre nós a figura da agência de publicidade. Era o corretor que virava empreendedor estabelecido. Criava uma empresa para angariar anúncios e contas. E prosperava. Com o sistema capitalista em expansão a produção para consumo, principalmente, necessitava de canais para mostrar o que era produzido e vender. Anunciar benefícios e preços de seus produtos e alardear o prestígio de suas marcas tornaram o setor produtivo o principal sustentáculo dos meios de comunicação. E assim as agências de publicidade romperam a metade do século XX e até hoje como um dos melhores negócios na área de serviços. No começo a agência era remunerada a seu bel prazer ou por acordo prévio entre os interessados. Pouco depois os negócios prosperaram tanto e eram tantas as agências que o setor se organizou, se autorregulamentou e impôs disciplina, criatividade, parâmetros e qualidade. Ao longo dessa caminhada a remuneração delas ultrapassou 30 por cento do valor contratado. Cálculo simples, para cada um real entregue pelo contratante à agência para veiculação de sua publicidade, ela ficava com mais de 30 por cento a título de comissão. Mesmo considerando a remuneração de sua cadeia produtiva era e é uma senhora remuneração em se tratando de intermediação de prestação de serviços. Hoje não é mais assim. Mas o setor produtivo só alcança o consumidor via comunicação e aí a publicidade é vital e imprescindível, assim como os meios de comunicação para chegar ao comprador. Por isso ela foi chamada pelos americanos de “A ALMA DO NEGÓCIO”. Mas se a publicidade é a alma do negócio, o volume de dinheiro que ela gira e os ganhos que proporciona é a mina de ouro do setor de serviços. A publicidade já foi chamada de o “espelho dos povos” por um publicitário francês, arguto observador do desenvolvimento social do século XX. E realmente é. Basta pesquisar sua evolução ao longo do tempo e veremos como se portou e evoluiu uma determinada sociedade. Não só por seus hábitos de consumo, mas por comportamento e nível educacional e cultural. Isso evidencia cuidado na elaboração de seu produto e por isso ela deve ser bem remunerada. Mas essa mecânica negocial, junto ao escopo de funcionamento e vendas dos meios de comunicação são responsáveis por um modelo de negócio que ainda mantém de pé a velha mídia e por hora retarda o crescimento da Internet. As verbas de publicidade são cada vez maiores. Embora a remuneração das agências já não se comporte com a fartura que foi até os anos 90 do século passado, o bolo do mercado publicitário é cada vez maior. Quanto mais cresce o consumo, quanto mais arriba a produção, mais publicidade se faz necessária. Escorados num modelo com um século de existência e altamente organizado, a velha mídia remunera bem esses intermediários. Os contratos variam muito e pouco se sabe sobre as remunerações hoje em dia. Mas muito do passado persiste, desde a remuneração de até 20 por cento do valor da verba publicitária até uma figura onírica chamada BV, que nada mais é que a chamada bonificação de veículo. É um prêmio em espaço publicitário ofertado pelos veículos às agências que mais inserem publicidade em suas programações. De posse desses BV’s as agências agregam mais faturamento, pois podem vender, negociar, ofertar ou simplesmente repassar ao seu cliente como desconto. A velha mídia é organizada, influente, esquematizada e faz opinião com a qualidade e critério de suas programações e informações tornando-se desta forma “confiável“ a todos, principalmente ao setor produtivo - o modelo de negócio persiste, apesar do avanço da Internet. Existe no mercado um enxame de exemplos, o mais evidente e curioso vez por outra se manifesta. Os grandes vendedores de varejo, os maiores anunciantes do país são um dos sustentáculos da velha mídia. Pois eles mesmos colocam anúncios chamando o consumidor para seus sites de vendas e suas empresas ponto.com. Ora, sabem eles, sabem as agências e sabemos nós, que os leitores, telespectadores e ouvintes da velha mídia são minoria frente à avalanche de acessos da à Internet. Um site de um colunista de Brasília tem mais acessos diários que a tiragem dos dois maiores jornais da cidade. Isso se repete por todo o Brasil. Em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, Belo Horizonte, Cuiabá e em muitas das nossas grandes cidades. Fora os grandes portais onde o acesso é dezena de vezes maior que o número de telespectadores e leitores, juntos. Mas publicidade, quase nenhuma em alguns casos e muito pouca em outros. Faltam-lhes a confiança e aceitação por parte dos anunciantes e boa vontade por parte das agências. A Internet ainda é desorganizada, incerta e padece de uma doença gravíssima, em termos de comunicação. Falta-lhe credibilidade naquilo que publica. Esses dois fatores atuam juntos, em favor da velha mídia. Desorganizada, ainda faltam-lhe cor, cheiro, maquiagem, segmentação e designer, para modelar o negócio e torná-la confiável. A web, embora seja uma floresta frondosa, encorpada, grande e aberta é cheia de trilhas e armadilhas onde não se sabe bem onde vão dar. Apesar disso, o seu mecanismo de aferição é muito mais confiável do que o da velha mídia. Estratificada, seu faturamento se dá numa proporção completamente diferente dos meios de comunicação tradicionais. Quando se organizar, poderá atrair o interesse das grandes agências com suas grandes contas e seus grandes faturamentos. São significativos os números das vendas pela internet dos sites de inúmeros produtos. Devagar ela engatinha com pequenos sustos nos gigantes. Há outros mistérios, entre os quais o programa BBB. O de número 10 faturou 340 milhões de reais, 20 por cento a mais que o de número 9. No entanto a audiência foi muito, muito menor. Mas o principal é esse que tratamos aqui. Se não vejamos: em 2009 a mídia brasileira faturou cerca de 23 bilhões de reais (cerca de 13,5 bilhões de dólares), um aumento de quatro por cento sobre o ano anterior. Segundo o grupo de mídia M & M em pesquisa junto com PricewaterhouseCoopers a TV aberta ficou dona de 60,9 por cento desse montante, mais da metade do investimento e cresceu 7,65 por cento sobre o ano anterior, chegando a 13,5 bilhões de reais. Enquanto jornais e revistas tiveram queda de faturamento, em comparação com o ano anterior, ficando com 8,11 e 6,18 por cento, respectivamente, a à Internet coube apenas 4,27 por cento da verba, algo em torno de um bilhão de reais, menos que o setor de rádio que ficou com 4,43 por cento do bolo. Enquanto este cresceu 9,35 por cento com relação a 2008 a Internet cresceu 25,2 por cento em relação ao mesmo período. Este ano, 2010, a expectativa é que cresça 30 por cento. No mundo, a Internet já é a terceira mídia em faturamento, estando à sua frente apenas a TV e os jornais. Ela está na frente inclusive, das revistas. Segundo resultado de estudos realizados pela empresa Zenith Optimedia, ela já está bem perto de ultrapassar os jornais. Em 2009 a web atraiu 55 bilhões de dólares de investimentos publicitários em todo o mundo e com isso tornou-se destinatária de 12 por cento do total de publicidade investido no planeta, ficou atrás dos jornais que atraiu 23,1 por cento e da TV que ainda reina absoluta com a receita de 39,4 por cento. As revistas amargaram um quarto lugar com 10,3 por cento do bolo. A mesma empresa projeta para 2012 seu crescimento para 17,1 por cento de participação na publicidade mundial enquanto os jornais terão 19,4 por cento. Daqui a dois anos, portanto, a Internet deverá atrair investimentos em torno de 83,9 bilhões de dólares contra 95,4 bilhões dos jornais e 199,7 bilhões de dólares para as TVs que estão então com uma participação de 40,6 por cento, do bolo total no mundo. Este ano de 2010 a Zenith estima que o setor publicitário no mundo venha faturar 456 bilhões de dólares. Para a América Latina a previsão é de 33 bilhões de dólares. Os números são expressivos tanto no Brasil como em todo o mundo. Mas por aqui e por ali, sutilmente, começam a surgir movimentos de mudança na forma de compra dos espaços, tempos publicitários e também na forma de remuneração das agências de publicidade. Esse mercado se move e inova muito. É comum as agências comprarem espaços, antecipadamente, adiantando recursos financeiros aos veículos e posteriormente leiloando no mercado. Essa forma de atuação ganhou o nome de bureau de mídias. Não vingou no Brasil. Experiências realizadas nos Estados Unidos já incorporaram agências de publicidade como parceiras nos lançamentos de produtos. Ao invés de serem contratadas nos moldes de contratos tradicionais, elas foram remuneradas pela criação e produção de campanhas, e comissionadas de acordo com o sucesso de vendas do produto. A gigante UNILEVER que gasta cerca de cinco bilhões de dólares por ano em propaganda em todo o globo reavalia sua estratégia de comunicação no mundo. O objetivo é a redução das comissões das agências de publicidade. Não por falta de criatividade e competência destas, mas com a finalidade de reduzir custos. Sejam lá quais forem as consequências no futuro dessas relações na publicidade, um setor de comunicação que cresce 30 por cento ao ano não poderá ser ignorado na hora da divisão do bolo publicitário. As agências se renderão à web quando esta se organizar. Hoje a participação da web já é maior que a dos jornais em muitos países, longe de ameaçar a TV, mas não deve demorar muito. O anunciante não é burro e deseja que o seu produto seja visto e comprado pelo maior número de pessoas possíveis.

1 de junho de 2010

ainda a banda larga no brasil (II)

O governo federal finalmente veio a público e anunciou o projeto do país para a banda larga. Com estardalhaço, a velha mídia emoldurou os números. Dizem e anunciam que serão investidos até 13 bilhões de reais para levar internet rápida a 28 milhões de residências em todo o país, atingindo principalmente, as classes C e D. Isso equivaleria a beneficiar mais de 60 milhões de pessoas em cerca de 5 mil municípios do Brasil. O Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) estaria destinado a reduzir em cerca de 70% o preço médio atualmente cobrado pelas concessionárias por uma assinatura de net rápida de um giga. Sairia por preços módicos, algo a partir de 15 a 20 reais, e assim seria possível levar internet rápida com baixo custo e alta velocidade para mais de 4 mil municípios, atendendo dessa forma a cerca de 80% da população distribuídas nos 26 estados mais o DF até 2014. A meta é elevar o número de domicílios ligados na banda larga de 13,5 milhões para 35 milhões daqui a 3 anos. Ao ser anunciado o plano as ações da velha Telebrás, a quem caberia a execução do projeto, subiram, num só dia, 48% na bolsa de valores de São Paulo. Muita gente ganhou dinheiro com isso. E ninguém ganhou banda larga. A ideia do governo é boa, apesar da grita das teles, e a Telebrás é a única capaz de levar a banda larga ao interior do Brasil, não só por sua infraestrutura e capilaridade, como também pela capacidade de subsidiar aqueles que não poderão pagar. E sem banda larga espalhada por todo o país, o Brasil jamais poderá crescer o que se espera. Entre os aportes do tesouro, BNDES, recursos com origens em fundos e outros créditos, o governo espera aportar na nova empresa 13 bilhões de reais nos próximos 4 anos e assim atender as metas fixadas com ofertas que irão de velocidades de 1 megabit por segundo (Mbps), a provedores de até 230 reais e os provedores repassariam aos usuários acessos a partir de 35 reais por 216 kilobits por segundo (kbps) e acesso de 750 Kbps custaria 50 reais, em média. Essas velocidades são risíveis perto do que existe nos países de primeiro mundo e até na Letônia e Bulgária, no Leste Europeu, com banda larga muito melhor e mais barata que a nossa. Mas, como diz o ditado popular “quem não tem cão, caça como gato” e está muito bom. Um pequeno detalhe, importante, foi omitido, nesse caso. A União Internacional de Telecomunicação, organização mundial que congrega os interesses das empresas de telecomunicações, espécie de FIFA do setor, em seus estatutos diz que a banda larga só é considerada a partir de 2 Mpbs . Não será o caso da nossa Telebrás. E por último temos o grave problema da Amazônia, onde se destaca o caso de Roraima que deverá ficar fora do programa. Nas expectativas mais otimistas do governo o alcance de Roraima pelo PNBL só se dará em 2014. Pensa-se em fornecer o serviço através da Venezuela por meio de sua rede de fibra ótica, já que a Venezuela é quem fornece a energia elétrica que abastece aquele Estado. No país de Hugo Chaves falta de tudo e com pouco se pode contar. Amazônia à parte, não será ela que irá impedir a caminhada do PNBL, apenas irá se juntar a centenas de outras localidades principalmente na zona rural onde a luz elétrica ainda é um sonho. A inclusão digital da região amazônica, sozinha, engole os 13 bilhões de reais previstos no programa. As teles estão chiando, esperneando, gritando aos quatro cantos que o governo está rompendo o compromisso assinado por ocasião do programa de privatização da telefonia. Após o anúncio da criação da Telebrás as teles foram ao mercado e contrataram grandes escritórios de advocacia com o intuito de embarreirar o PNBL. Ora bolas, essas teles vendem banda larga no mercado a preços proibitivos e velocidades horrorosas. A banda larga no Brasil é uma das piores e mais caras do mundo. E mais, elas não têm condições de realizarem os investimentos necessários. Somente a título de ilustração, a OI não tem mais capacidade de endividamento junto ao BNDES, o grande agente financeiro do desenvolvimento nacional. A OI já foi até na China buscar financiamentos, está endividada nos quatros cantos e continua a vender serviços caros e ruins, reconhecidos até pela ANATEL, a agência reguladora do setor. A TIM vende uma assinatura de 7 megas com modem para notebook e quando você vai usar, ela não passa de um mega. Esse logro se sucede em todas as companhias, isso sem contar que elas são as campeãs de reclamações por parte dos usuários em todo o tipo de serviço que vendem. É justo que o governo volte ao setor. Agora o que não se discute, o que a grande mídia e o setor ignoram são os investimentos previstos para a Telebrás levar a banda larga para todo o país. Os 13 bilhões de reais previstos não dão para nada. Com esse dinheiro nunca teremos banda larga boa. Pois saibam que a Itália com menos de um quarto de nossa população e territorialmente 20 vezes menor vai investir nos próximos 10 anos, 10 bilhões de euros para levar a banda larga aos menos favorecidos. Os Estados Unidos irão investir no mesmo período 100 bilhões de dólares, isso mesmo que você leu, 100 BILHÕES DE DÓLARES, para o mesmo fim. Considere que o número de pobres na América é muito menor que o nosso e a banda larga prevista para esses dois países terá uma velocidade mil vezes maior que a nossa. Portanto, por enquanto, o nosso sonho de banda larga boa e barata é uma quimera. *Hildeberto Aleluia é jornalista