30 de maio de 2014

SALADINO

A propósito da recente visita do Papa Francisco a Jerusalém um pouco da história da Palestina na trajetória desse intrigante personagem que conhecemos como Saladino.

A inteligência, como espionagem e informação militar começou a se estruturar nas batalhas de guerra cerca de dez séculos depois de Cristo (D.C.) e o responsável pelo princípio dessa organização foi um líder islâmico árabe chamado SALADINO. Foi ele um dos primeiros, no segundo milênio D.C. a valorizar a informação como arma. Seu nome verdadeiro era Yusuf ibn Ayyub, e seu povo o chamavam por Slalah-al-Din “o retificador da fé”, e como Saladino pelos exércitos das cruzadas.


Segundo Ernest Volkman em seu livro A HISTÓRIA DA ESPIONAGEM, lançado no Brasil em 2013 pela Editora Escala (www.escala.com.br) na página 49, “Saladino era um oficial do exército de um dos senhores da guerra árabe de nome Nur-al-Din da Síria. Começou a destacar-se com uma série de pequenas vitórias táticas sobre os cruzados que, em breve, o impulsionaram para o front das fileiras das forças árabes. Sem dúvida era um líder militar de primeira ordem”, assegura Volkman.

Para entender melhor esta época, na página 48 Volkman explica que “em 1095 a Europa foi subitamente tomada por uma mania religiosa inspirada pelo Papa Urbano II que decretou uma guerra santa contra o islã”. Urbano II imaginava, segundo registros do Vaticano, que a ala oriental da Igreja Católica com sede em Constantinopla, “estava em grave perigo ante uma maré islâmica que já penetrara na maior parte do Oriente Médio e na Ásia Central. Acreditava Urbano que” o objetivo final do islamismo era o de submeter toda a Europa ocidental e destruir a Igreja Católica” assegura Volkman. O poder muçulmano instalado em Jerusalém ameaçava destruir o Santo Sepulcro.

Foi essa percepção que inspirou reis, nobres, senhores de terra e camponeses comuns a doarem muito do que possuíam e alistarem-se em poderosos exércitos para invadir Jerusalém e retomar a cidade santa, sob o julgo do islã, para a Igreja Católica. Essas mobilizações ficaram conhecidas como As Cruzadas (foram oito) e a esses “soldados de Cristo” foi lhes prometido o perdão dos pecados e a salvação eterna como recompensas espirituais por seus serviços. Além disso, o produto dos saques era regiamente dividido de acordo com a importância de cada um. No ano de 1.099 os cruzados tomaram Jerusalém.

Segundo Volkman, na página 49, “os exércitos dos cruzados, reunidos por toda a Europa, marcharam para Constantinopla, depois embarcaram em navios que os levariam à Terra Santa. Marcharam cegamente para o que acreditavam ser uma luta apocalíptica, sem nenhuma ideia real do que havia à frente deles (Essa Cruzada a que se refere Volkman foi a Terceira, sob o papado de Gregório VII e comandada pelo Rei da Inglaterra Ricardo I) tampouco houve quem alertasse para a ideia de realização de reconhecimento de terreno, de avaliação de território ou qualquer tentativa de levantamento de dados ou qualquer inteligência sobre o tamanho e a capacidade das forças militares árabes.

Ainda na página 49 Volkman considera que “do jeito que as coisas aconteceram os cruzados tiveram muita sorte. Embora os árabes estivessem unidos religiosamente sob a bandeira do islã, eram profundamente divididos sob o aspecto político”, como o são ainda hoje.

Segundo Volkman, “as populações árabes residentes consideravam os cruzados apenas como intrusos profanos e entenderam que a libertação só viria quando os fracionados reinos árabes se unissem sob um grande líder”. Finalmente em 1.171 esse grande líder surgiu. Para Volkman era um homem que iria transformar a história e que seus inimigos ocidentais deram-lhe o nome de Saladino. Havia mais de 70 anos que Jerusalém e toda a Costa do Mediterrâneo estavam em poder dos cruzados.

Volkman assegura que Saladino “argumentava incansavelmente que as forças árabes divididas teriam de unir-se para expulsar os cruzados. Esta afirmação ele provou ao comandar vários exércitos árabes, unidos, conduzindo-os para a vitória frente às poderosas forças francas que buscavam expandir o território cruzado na Palestina. O triunfo de Saladino eletrizou o mundo árabe e fez dele o líder supremo do que então se tornou um exército árabe unido”.

A vitória de Saladino sobre os francos foi possibilitada, segundo Volkman por uma extensa operação de espionagem e inteligência: “Saladino fundiu as várias fontes de espionagem dos comandantes árabes e numa operação alastradora transformou milhares de árabes sob a ocupação dos cruzados, em seus olhos e ouvidos.

Percebeu que não poderia depender das informações coletadas pelos serviços de espionagem de cada um dos Kalifas que trabalhavam voltados para os interesses dos chefes e segundo Volkman cada Kalifa direcionava seu KHABAR (chefe de espionagem) a concentrar seus esforços nos inimigos internos, sendo que apenas o Khabar do Kalifa de Bagdá tinha 1.700 mulheres idosas em sua folha de pagamento. “Elas recolhiam toda espécie de boatos, por mais trivial que fosse, com especial atenção a qualquer expressão de deslealdade, mesmo a mais amena delas” descreve Volkman.

Em sua narrativa assegura que os Cruzados não tinham nenhum conhecimento sobre os seus inimigos árabes. Acreditavam na proteção divina e na espada. Enquanto isso Saladino enredava o exercito cruzado numa guerra de guerrilha fornido por informações que vinham desde o verdureiro até as fontes que abasteciam de água o Exército invasor. Conseguiu a preciosa informação de que uma frota de navios desembarcaria em algum lugar com suprimentos para a tropa. Bloqueou esta manobra e não restou ao comandante Ricardo I nada além de negociar. Em troca da retirada do Exército cruzado Saladino permitiu o acesso de peregrinos cristãos à Cidade Santa. Tornou-se Rei de Jerusalém que foi governada pela família até a terceira geração de 1.193 até 1.250.

A grande maioria dos historiadores tratam Saladino com certa indulgencia. Como se ele não fora um feroz matador, guerreiro e impiedoso como todos os outros. Até mesmo o italiano Simon Sebag Montefiore, autor da magnífica biografia sobre Jerusalém lançada no Brasil pela Editora Companhia das Letras em 2013. Na página 337 ele descreve:

-Em dois de Setembro de 1.192 o sultão Saladino e o Rei firmaram o Tratado de Jaffa, a primeira partição da Palestina: o reino cristão ganhou novo impulso com Acre, como capital, enquanto Saladino ficou com Jerusalém, assegurando aos cristãos o pleno acesso ao Santo Sepulcro. O Conselheiro do Rei Hubert Walter discutiu sobre Ricardo I com Saladino, que era de opinião que o Coração de Leão não tinha sabedoria nem moderação. Graças a Walter, Saladino permitiu a volta dos sacerdotes latinos ao Sepulcro.

Saladino não só permitiria a volta dos sacerdotes cristãos como também atendeu a uma reivindicação do Imperador bizantino Isaac Ângelo que exigia o mesmo para os ortodoxos. E Saladino decidiu que uns e outros deveriam partilhar a supervisão do Sepulcro. Após os acordos Saladino e Ricardo I partiram cada um tomando o caminho de volta. Coração de Leão para a Europa e Saladino para Damasco onde morreu aos 54 anos.

É provável que este sábio acordo tenha influenciado a todos que o biografaram. Ainda mais se considerarmos que ou foram judeus ou cristãos, ocidentais, que escreveram sobre ele o farto material que nos chega. Mas não fica a menor dúvida que era um sábio ao administrar a informação, a espionagem, a bisbilhotice, e a política.

É verdade que Saladino e seus descendentes harmonizaram a Palestina por algumas décadas. A condescendência não chega a ser de todo injusta por este gesto.

Mas quem se dedica a estudar e pesquisar esta época percebe muito bem que Saladino apesar de haver imposto derrotas em muitas batalhas travadas com o Exército do Rei Ricardo I este não chegou a ser totalmente vencido. Tanto que o fim das batalhas entre os cruzados e as tropas de Saladino foi um acordo. Mas Ricardo Coração de Leão passou à história como perdedor.

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