12 de junho de 2014

A Internet e o Marco Civil ( I)

O Marco Civil da Internet me intriga. Primeiro pelo nome. Marco Civil. Então agora teremos um marco militar? Esse Civil não está ai à toa. É a marca do nosso bolivarianismo. Vem da cartilha gramsciana (Antônio Gramsci 22/01/1891 a 27/04/1937) filósofo e um dos fundadores do Partido Comunista da Itália onde ensina a transição para a sociedade comunista. Sua obra, expressiva, não difere em nada do pensamento leninista. A expressão está perfeitamente assimilada e incorporada por conveniência pela velha mídia. Todo dia tem: a sociedade civil... Especialmente pelas Organizações Globo.

Finalmente ele foi aprovado no Congresso Nacional depois de anos por ali. Disse o relator, o Deputado Federal Alexandre Molon (PT-RJ) que rodou o país inteiro debatendo com a sociedade em exauridas audiências publicas. Trata-se de uma Lei para a Internet no Brasil. Tanto o Executivo quanto o Legislativo e a velha mídia, fixaram-se, obsessivamente, num negócio chamado NEUTRALIDADE DA REDE. Era o que interessava às teles e provedores. E eles ganharam. Veremos como.

Em seu artigo I a Lei diz que “estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil”. Louvável a intenção e este objetivo. Só que esqueceram o internauta; dos direitos do navegador e dos deveres de quem expõe ideias, projetos, vendas, serviços, assistência e informações por ali. Coisas banais do tipo: todo site está obrigado a se registrar em tal lugar e expor com clareza no sua HOME (página de abertura) os nomes dos responsáveis, canais de atendimento, inclusive endereço e telefones, visíveis, bem como CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica) além de um canal expresso para comunicação, via Internet.

Quem entende de Internet percebe claramente que nem o governo, nem o legislativo, sabiam direito o que estavam a legislar. O resultado é uma Lei cheia de platitudes e de reafirmações de princípios já consagrados na Constituição ou em outras leis. Traz uma redação gongórica, contorcionista e de difícil entendimento. Em alguns de seus itens está claro que a decisão foi toda transferida para o Juiz de acordo com sua interpretação. Em suma: em muitos de seus artigos ela não é clara o suficiente para facilitar a vida do Magistrado. Desnecessário dizer que a Lei ainda precisa de várias regulamentações. E será por Decreto.

A INTERNET E O MARCO CIVIL (II)

Quando nossos parlamentares não querem assumir responsabilidades, transferem ao Executivo o poder de decidir através de Decretos o que realmente irá valer numa Lei aprovada por eles no Congresso Nacional. Engenhosa artimanha para dizer que fez, mas na realidade nada fez. Lá na frente, quando das edições dos tais Decretos muita coisa poderá ser mudada ao sabor dos interesses do dia. Quem sabe hoje o que virá amanhã em termos de administração publica no Brasil? Inclusive a liberdade da Rede poderá ser regulada por Decreto. Os doutos parlamentares do Congresso Nacional facultaram esse poder ao Presidente da Republica. Quem saberá se na hora da regulamentação as teles e provedores não acabarão sendo beneficiados em detrimento dos usuários? Ninguém. E a tão falada NEUTRALIDADE DA REDE? Será que um Decreto, um dia, não poderá contemplar o que hoje desejam as teles e os provedores. E lá estará escrito: " de acordo com a Lei ".

Ah esse Congresso Nacional. Sempre esquecendo o povo na hora de legislar. Para maquiar a Lei foi dito que ela se destina a ditar os direitos e responsabilidades dos usuários e provedores “de Internet no Brasil e outros serviços on-line, defendendo, principalmente que o acesso à Internet é essencial ao exercício da cidadania”. E o texto ainda delega a governos estaduais e municipais, mecanismos (faltou dizer quais) de “governança multiparticipartiva, transparente, colaborativa e democrática, com a participação do governo (?) do setor empresarial, da sociedade civil (olha ela ai de novo) e da comunidade acadêmica. Fomentar a produção e circulação de conteúdos nacional”. Só mesmo um supercomputador para explicar direitinho o que isso ai significa e como implementar.

Outro esquecimento dos legisladores: a Lei das licitações é explicita no que diz respeito aos atos de compra e venda a serem efetuados pelas administrações publicas quando obrigam estes administradores a publicaram em jornais “de grande circulação” anúncios para contratações de compras e vendas de equipamentos, construções e de serviços diversos. Da mesma forma a lei trabalhista obriga empregadores a publicaram anúncios nos jornais em diversas situações que contemplam as relações entre patrões e empregados e até perda ou roubo de documentação de empresas e pessoas.

Ora bolas, jornal de grande circulação é uma coisa que está deixando de existir. Qualquer site criativo bate de longe a circulação de qualquer grande jornal. Porque o tal Marco Civil, a Lei para a Internet no Brasil, não contemplou os sites do local, ou da cidade, onde ocorra a necessidade. Nesse caso protegeu a velha mídia em detrimento da Internet. Prefeituras, empresas e pessoas de cidades do interior do País são obrigadas a publicarem anúncios em jornais das capitais de seus respectivos estados que muitas das vezes estão a milhares de quilômetros de distância, enquanto o site está logo ali, na esquina, ou na repartição, ou no escritório, ou em casa, e com muito mais visibilidade.

A INTERNET E O MARCO CIVIL (III)

Quanto à Neutralidade da Rede é assim: eu tenho uma assinatura de dois megas. Você tem uma de cinco megas. Natural que você navegue melhor do que eu, pois paga mais para receber dados mais rápidos. Mas a velocidade dos dados na Rede é a mesma para os dois. O que os provedores desejam é manter a sua velocidade e diminuir a minha. Se a sua necessidade for maior do que os cinco megas contratados, a sua também será afetada. E aí está aberto o caminho para cobrar duas vezes. Pela banda e pela velocidade. Aumento de tarifas. Na prática é isso.

Meia dúzia de abaixo assinados rodaram na Rede para que o projeto não fosse aprovado como inicialmente estava redigido, favorecendo as teles e os provedores. O abaixo assinado do ex-ministro e cantor Gilberto Gil chegou a recolher mais de 350 mil assinaturas. Ele quis somente testar sua popularidade porque em nada contribuiu no Projeto. As pessoas assinaram tais manifestos, inclusive eu, reivindicando e esperando muito mais do que contemplou o tal Marco Civil. No Portal da Câmara dos Deputados o texto teve 45 mil visitas, 2.215 comentários e 374 propostas. Ficou parecendo que quem elaborou o projeto não tem a menor ideia do que é a Internet.

Ao deixar lacunas para serem resolvidas no judiciário, por mitigação, desconhece que existe hoje 92 milhões de processos aguardando julgamentos no Poder Judiciário e que esse Poder (Federal e estadual) consumiu 50,7 bilhões de reais no ano de 2012, sendo que 88,7 por cento dessa quantia foi para pessoal. Para essa torrente de processos existem menos de 18 mil juízes, em todas as instâncias.

O estamento judicial do País não consegue dar conta da atual demanda. Só na Justiça do Trabalho, no país inteiro, aporta uma média de dois milhões de processos, anuais. Estas informações estão num blog especializado e foram publicadas em 27 de abril de 2014 num artigo intitulado: GASTOS COM JT ACUMULA 1,15 TRILHÀO DE REAIS (veja mais em www.justicadotrabalho.blogspot.com) do ex-Juiz e Jornalista Roberto Monteiro Pinho e republicado em mais 39 sites especializados.

Imagine agora a Internet com seus milhões de navegadores diários, gerando demandas de atritos e querelas onde o Judiciário será o caminho natural para agredidos, ofendidos, insatisfeitos, vítimas e algozes?

Não há sensatez no Marco Civil. Da forma como ficou, questões cruciais e questões banais serão resolvidas na justiça quando poderiam perfeitamente ser encaminhadas para uma Agencia Reguladora com as questões sendo resolvidas de forma simples e direta como num juizado de pequenas causas. Até mesmo pela ANATEL onde poderia ter se sido criado um departamento, uma seção ou mesmo uma subdivisão qualquer destinada a esse fim.

Já passou da hora de o Congresso Nacional criar entre suas comissões permanentes, uma Comissão dedicada exclusivamente à Internet.

A INTERNET E O MARCO CIVIL (final)

Faltou ao governo federal e ao Relator do Marco Civil ouvir os titulares das delegacias virtuais. Se foram, não divulgaram. Em muitos Estados, especialmente no Rio de Janeiro, que foi pioneiro, existe a Delegacia Virtual. Antes, na falta de Lei, muitas das questões eram esclarecidas ali mesmo com a mediação dos policiais. Eles poderiam ter contribuído em muito para o aperfeiçoamento da Lei, especialmente no que diz respeito ao usuário da Internet. Fica aqui uma sugestão para o próximo Congresso: rever a Lei e desta vez com a contribuição de quem entende e contemplando, sobretudo, o internauta. E aglutinar numa só Lei, clara e objetiva, tudo que diga respeito à navegação na Rede.

A Internet é uma floresta. Trata-se de um mundo novo, cheio de dúvidas e extremamente vulnerável. O Marco Civil ficou muito restrito a liberdade de expressão, direito a privacidade (sendo que estes dois artigos estão consagrados entre nós não só na Constituição como em leis ordinárias) guarda de dados e Neutralidade da Rede. Sobre a privacidade, não faz muito tempo outra Lei foi promulgada quando do caso da atriz Carolina Diekman que teve fotos íntimas divulgadas na Internet.

Da mesma forma o Marco Civil ignorou, solenemente, a questão do consumo do comércio eletrônico na Rede. Está no Senado Federal outro projeto, cujo Relator é o Senador Teodorico Ferraço (PMDB-ES) que atualiza o atual Código de Defesa do Consumidor que foi promulgado em 1990, o CDC. A introdução de regras para o comércio eletrônico é uma das principais questões visadas pelo Relator “além de ações para combater o super endividamento do consumidor e de medidas para dar prioridade ao processamento e julgamento das ações coletivas ” como ele mesmo especificou ao jornal Valor Econômico de 20 de outubro de 2014 à página A 11 ( www.valoreconomico.com.br )

Há uma nuance aqui. O CDC vai contemplar o consumidor no comércio eletrônico na área de pós venda e não o consumidor versus Internet. Os sites de compra e venda, não querem ser considerados como prestadores de serviço, no Brasil. Outra vez fica claro a falta de quem entenda de Internet para assessorar esses políticos que muito mal navegam e desconhecem a selva que é a Rede. No Congresso Nacional não existe um parlamentar sequer que entenda, especificamente, desse assunto. O paradigma deles, a referência é o universo das telecomunicações. A geração deles desconhece como funciona esse novo mundo. Pode não faltar bom senso, mas falta-lhes conhecimento.

Ao que parece ignoraram o Conselho Gestor da Internet no Brasil, o CGI, a própria Anatel, a Agencia Nacional de Telecomunicações e a Câmara de Comércio Eletrônico. Trata-se de uma área vital e desprovida de qualquer amparo ao internauta. São companhias aéreas que produzem seus sites da forma que desejam dificultando e onerando a vida do consumidor, quando não ludibriando mesmo. São os sites de bancos onde você solicita uma demanda e eles ignoram; sites de serviços; sites de milhagens que não possuem nada que os regulamente, aqueles dos serviços públicos que não atendem nem respondem e de empresas de toda sorte.

Nada disso tem uma regulamentação própria de Internet. Eles são olhados, fiscalizados, quando são, pelo PROCON e somente no pós venda. Sem considerar que o CONAR (Conselho Nacional de Regulamentação Publicitária) só fiscaliza o que diz respeito à publicidade a produção e veiculação do que está na velha mídia e migra para o virtual. Jamais ao contrário ou especificamente o virtual. O que existe de propaganda enganosa, de ludibriação e engodo é espantoso. E como exemplo os sites de vendas de passagens aéreas. São centenas. Todos vendem passagens mais caras que os sites das próprias companhias aéreas. Mas o consumidor, o internauta, não sabe disso.

Como teste, escrevi para grandes empresas, as mais diversas. Ao meu banco solicitei talões de cheques. Por três vezes. Nada. Tive que telefonar. No site não há um fale conosco. Gastei pulsos na chamada. Três meses depois o Itaú ainda não enviou os cheques. Na companhia aérea é um robô que atende no site. Da mesma forma no site de milhagem. Nada resolvem. Ai você tem que ligar. Gastar pulsos quando já paga pela banda. E se for um bilhete aéreo você pagará a ligação e mais uma taxa para emitir o bilhete por telefone.

A um frigorífico em Goiás e outra empresa de produtos alimentícios solicitei preços e informações de seus produtos. Jamais responderam aos e-mails enviados. Se não respondem informações imagine devolução de mercadorias ou dinheiro. No site do Ponto Frio, um dos maiores de varejo, o valor da compra é revertido em pontos num programa de milhagem aérea. Esqueceu-se de creditar. Depois de vários e-mails creditaram uma parte e ao último e-mail responderam mandando uma recomendação para ligar num determinado numero. Mais gastos com pulsos.

Esqueceu-se de contemplar na Lei os crimes praticados por Crackers e Hacquers que através dos provedores usam e abusam, sem que estes saibam de antemão que se trata de uma falsidade ou infâmia enxovalhando a biografia de terceiros (veja a maestria do golpe em www.aleluiaecia.blogspot.com) como está explicada e exposta numa série de artigos lá publicados com o título UMA NOVA LEI PARA INTERNET NO BRASIL nos meses de novembro e dezembro de 2012.

De resto o tal Marco civil não difere em nada da forma como as leis são feitas no Brasil. Sempre tomando o partido do Estado e penalizando ou dificultando a vida do cidadão. E como complemento, leis mal redigidas, mal elaboradas, de boa ou má-fé, e jogando para um judiciário sobrecarregado, as decisões que obriga a cada Juiz estudos e comparações, quando não aguardar jurisprudência de tribunais superiores para só então vir a decisão. Isso leva tempo e é mais um fator da falta de justiça e demora nos julgamentos causados por leis mal feitas.