9 de fevereiro de 2011

OBSERVANDO A MÍDIA

Artigo publicado em
05/10/2010
17:51

Coluna Claudio Humberto
Observando a mídia
por aleluia, hildeberto


Chama a atenção a desconcertante ojeriza cultivada pelos profissionais da velha mídia com relação à internet. Um dos meus primeiros artigos sobre a nova plataforma de comunicação enfocava a televisão e sua luta desesperada frente à perda de audiência constante. Pois bem, um amigo meu, executivo de uma das três maiores redes de TV do país, após a leitura do artigo me telefonou e disse que havia gostado do que leu. Reconhecia as inovações, se mostrava surpreso com o conteúdo do livro A Cauda Longa e me ponderava que apesar disso não iria repassar o artigo, pois o mesmo combatia o seu ganha pão. Nem rebati. Aceitei seus argumentos muito embora em nenhuma linha do que escrevo advogue a supremacia dessa ou daquela plataforma de comunicação. Outro amigo, executivo de um grande jornal do Centro Oeste do Brasil tem horror a email. Sua secretária afirma orgulhosamente que o “senhor fulano não abre emails”. Ou seja, não adianta lhe enviar mensagens eletrônicas, pois nem computador ele tem. Suas mensagens ficam no computador da empresa e são abertas pela secretária. Pesquisa realizada pelo jornal Folha de São Paulo na sua própria redação atestou que 89 por cento dos jornalistas ouvidos estão otimistas com relação ao futuro do jornalismo no modelo atual e 35 por cento deles acreditam que a WEB jamais superará o impresso como principal veículo informativo e admitem que a crise dos impressos é algo muito relativo. Esse otimismo é mais que desinformação, trata-se de paixão pelo meio impresso que acaba gerando certo preconceito com a nova plataforma de comunicação. Um outro amigo, também executivo de um grande grupo de mídia no eixo Rio - São Paulo não gosta de admitir que seu jornal despenca em tiragem com números assustadores. Mesmo diante dos números que atestam a preferência dos leitores ao portal de internet de seu jornal em detrimento da edição impressa ele não cede. Argumentou-me certa vez que essa preferência maciça não se traduz em faturamento, em lucro, em dinheiro. O acesso ao portal chega a ostentar uma diferença de um milhão para cem. Ele sustentava que apesar da maioria esmagadora na preferência da internet, o faturamento do portal atingia a apenas 20 por cento do bolo. E é verdade, e não só no Brasil. Esse porcentual é a média em todo o mundo em todas as empresas de mídia. É uma distorção surpreendente e uma constatação verdadeira. E por que isso acontece? Acontece, principalmente, por que o jornalismo na internet ainda não tem um modelo de negócio consolidado. Compete com uma engenharia negocial arraigada e forte, privilegiada pela atuação e remuneração das agências de publicidade. Enquanto na internet o preço dos anúncios é barato, o preço de uma página de jornal ou revista é, às vezes, quinhentas vezes mais caro. Até quando isso persistirá? Não sabemos, mas não deverá durar muito, visto que uma página do jornal do grupo do meu amigo, teoricamente, segundo o Instituto Verificador de Circulação (IVC), é vista, diariamente, por uma média de 300 mil pessoas. Uma página de anúncio no mesmo jornal custa em média 350 mil reais enquanto um anúncio na mesma página no jornal virtual não passa de 12 mil reais, em média, e é acessado por mais de um milhão de pessoas, teoricamente. Dessa forma o faturamento dos meios impressos com relação à propaganda se mantém em 80 por cento frente à internet nos grupos de mídia ao redor do mundo. Mas o mesmo não se observa com relação à lucratividade. Aqui no Brasil, tradicionalmente, o negócio do jornalismo pertence a empresas familiares, com capital fechado. Os números reais são ofuscados e protegidos pela legislação de empresas limitadas. Mas sabe-se que o negócio é altamente lucrativo e já não se circunscreve ao setor editorial. Cada órgão de mídia é uma cabeça de um vasto grupo empresarial. O produto mídia costuma está inserido numa vasta rede de interesses comerciais e empresariais e é usado como uma moeda poderosa, principalmente frente aos governos. Sem contar com os incentivos e a elisão, fiscais. Mas na hora que se olha a relação custo versus faturamento do órgão de mídia o primeiro aumenta e o segundo cai. Caem também as taxas de investimentos no negócio e mantém-se a lucratividade. Mas compromete-se a qualidade. Principalmente a qualidade da informação. Isso no que diz respeito aos periódicos diários que já não prezam o bom jornalismo. No domingo, dia 26 de setembro de 2010, os jornais Folha de São Paulo e O Globo, o primeiro na página 35, caderno Eleições 2010 e o segundo na página C 5, caderno Cotidiano, trouxeram matéria sobre um mesmo assunto, a cidade de Araraquara, interior de São Paulo. Ambos pautados pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), sobre um tal índice IFDM (Índice Firjan de Desenvolvimento), que diz medir o ranking das melhores cidades para se viver no Brasil. Embora realizadas por equipes diferentes as duas matérias pareciam feitas por um mesmo repórter. E em nenhuma delas, apesar de uma ampla descrição da economia local, consta a informação do número de habitantes. Informação essencial e relevante para se ter a noção do tamanho do município. Qualquer estagiário de jornalismo sabe que essa informação é fundamental no corpo da matéria. Como redações importantes e experientes editam matérias com esse tipo de erro? Como revisores atentos, preparados e bem equipados deixam passar um texto sem uma informação crucial para o leitor? Editam matérias assim porque já não primam pela qualidade da reportagem. Na tentativa de assegurar a preferência do leitor cada vez mais os profissionais estão voltados para a opinião e não para a informação. Ou mesmo quando se faz necessária a informação em primeiro lugar, ela vem cercada de opinião de tal forma que muitas vezes não se consegue discernir a importância dos dados tal é a força e a qualidade da opinião. Esse mecanismo é o que levou o jornal Folha de São Paulo a afirmar, na véspera das eleições presidenciais colombianas de 2010, que o adversário do atual presidente Santos, o ex-prefeito da capital, Bogotá, o candidato Mockus competiria de igual para igual. No dia seguinte, votos apurados, Mockus não passava dos trinta por cento na preferência do eleitorado. As urnas consagraram com mais do dobro dos votos o candidato do governo. O ex-prefeito foi tratado pela mídia brasileira como um competidor com total possibilidade de vitória. Isso nunca aconteceu. As redações de hoje privilegiam a opinião. E revisores, bem revisores não há mais. No passado conhecido como copydesk, aquele que revisava, revia os textos dos repórteres foi abolido das redações em nome dos custos, da rapidez e da eficiência. Cada repórter passou a ser o seu próprio revisor. E mais, é comum um mesmo editor para várias sessões e na maioria das vezes ele não tem tempo de corrigir nada. Mal consegue editar bem as matérias. Esse escopo de trabalho compromete o resultado final. Usei apenas um pequeno exemplo dos muitos, diários, que aparecem nas páginas dos principais jornais. Não parece, mas o leitor observa e anota as distorções, e em tempos de internet, a preferência oscila em velocidade de megabytes.



Aleluia, Hildeberto é jornalista

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