18 de janeiro de 2014

CARLOS MAGNO E SEU IMPÉRIO (II)

Na realidade o homem nunca viveu sem espionar e sem bisbilhotar em busca da informação. Tanto servia para suas conquistas como para vigiar e dominar os povos conquistados. Desde o Egito antigo já era assim. E buscavam apoio nos deuses para orientação e controle dos demais. Ao longo da existência foi-se aprimorando os métodos de espionagem. Como já vimos do Rei David até a era cristã o homem espionava em busca de um tipo de poder que significava terras e riquezas. No Oriente a riqueza maior era Jerusalém. E antes de virarem reis, sultões, califas e chefes de exércitos eram na realidade salteadores. Assim que se apoderavam da terra e de suas riquezas criavam seus serviços de inteligência, espionagem, não só para garantir a conquista como para empreender novas.

A religião, os deuses, sempre funcionou como uma linha auxiliar numa incipiente era de institucionalização da espionagem. Ao longo da história merece destaque dois conquistadores: um no ano 8 da Era Cristã, Carlos Magno, na Europa e o outro no Século 13, na Ásia e conhecido como Gengis Khan. O primeiro passou à história como culto e letrado já que era versado no latim e no grego. Já o segundo deixou a imagem de bárbaro, sorrateiro e sanguinário. Ambos foram valentes guerreiros, sanguinários conquistadores e formadores de impérios. Jamais prescindiram da espionagem para formar seus reinos. Sem a informação precisa jamais teriam forjado seus impérios.

Carlos Magno nasceu em 742 (D.C.) e viveu até o ano de 814. De origem Germânica, hoje Alemanha, forjou os alicerces do mundo ocidental na base da espada, de muito sangue e da fé. Filho de um Rei Franco chamado Pepino, o Breve, em 771 herda o trono e dá inicio ao período da história medieval conhecida como Império Carolíngio. Foi ele, com seu exército, o responsável pela fundação do Sacro Império Romano Germânico.

Com a queda de Roma o mundo de então se dividiu, e as tribos bárbaras, nômades, senhores de guerra e de terras, cada um ao seu jeito desejava criar seu reino. A Igreja Católica e o Islã, por essa época, Século 8, se ajustavam em busca de fiéis e de reinos. Onde houvesse um grupo de pessoas falando um único dialeto, ali se formava um exercito e o mais forte virava Rei, Chefe ou Senhor da guerra. E quanto mais terra conquistasse mais poder teria. Inculto, não sabia ler nem escrever, mas esperto, Carlos Magno se alia aos senhores da Igreja e aprende latim, grego, a respeitar a Cristo e a ouvir, como conselheiros, bispos, cardeais, padres e monsenhores. Estes senhores não tinham um Estado, mas tinham informações e cultura.

Em nome de Cristo Carlos Magno passou a conquistar terras e a unir a Europa no que restou do Império Romano obrigando os povos conquistados a se converterem ao cristianismo. Essa era a motivação das conquistas. Sob a inspiração, e informação, dos clérigos fez as primeiras cruzadas rumo a Jerusalém, editou normas e criou parâmetros que fundamentaram o que mais tarde seria conhecida como a Europa. Soube usar, como quase nenhum outro, o poder da informação concentrado na Igreja Católica. O clero dispunha dos confessionários, da sabedoria, da leitura e da pregação da fé para unir os povos e desfrutar das riquezas. Em síntese: tinha as informações. Era um aliado precioso que Roma não soubera preservar. Com essa aliança, mas o cavalo e a espada ele viria a unificar a Europa e tornar-se o Imperador do Sacro Império Romano Germânico nomeado pelo Papa Leão III. Reinou até sua morte em 814 e deixou o Império aos filhos e netos que não souberam preservar.

Em uma magnifica biografia chamada CARLOS MAGNO (editora estação liberdade, 697 páginas) de autoria do professor francês Jean Favier, assim ele descreve o personagem:

Existe o Carlos Magno da história e o da lenda. O primeiro desenhou uma nova Europa, o outro fez sonhar. Os dois, o homem que foi e o personagem que o tempo construiu, forneceram durante doze séculos a mas notável das referências, tanto intelectual quanto política.

Diz ainda que o homem e sua obra são de uma diversidade que beira o paradoxo. Adverte que a preocupação que conduz e domina sua ação é aquela da unidade política e religiosa do Ocidente cristão. Afirma ser ele “homem de Estado de rude autoridade mas sensível à opinião daqueles que escolheu por conselheiros”. Autodidata imbuído de poesia latina e leitor do grego iniciou um renascimento intelectual benéfico tanto para os laicos quanto para os clérigos , bem como uma construção politica e um sistema monetário que durariam mil anos. Chefe de guerra impiedoso e defensor da fé tanto nos campos de batalha quanto nos debates teológicos, organizador de um verdadeiro Estado que federalizou povos.

Na página 87 o autor chama a atenção para o fato de que os bispos e abades tinham um peso politico multiplicador por sua capacidade intelectual de assumir responsabilidades outras que não as militares.

No entanto a obra passa ao largo da estratégia de inteligência fornida de informações e bisbilhotices fornecidas pelos clérigos que possibilitou ao guerreiro subjugar povos e sustentar seu Império. Esse viés não costuma fazer parte da historiografia dos vencedores

Os historiadores validam a trajetória dos guerreiros apenas pelo brilho das conquistas e nunca pelo lado sujo do sangue e da espionagem. O passar dos anos serve para realçar as virtudes e a ética assim enterrando a barbárie. Justiça se faça a honrosa exceção encontrada no livro JERUSALÉM a biografia, de SIMON SEBAG e editado no Brasil pela Companhia das Letras ( 798 páginas). Ele não poupa ninguém, do Rei David até nossos dias. Sua pesquisa e narrativa trata de 4 mil anos de sangue, suor e lágrimas. Mas no geral o déspota se transforma em herói e o mecanismo de dominação e controle é esquecido. A informação que sobrevive é banhada por uma aura de heroísmo que o tempo se encarrega de luzir. Assim é também com os déspotas do século XX, como veremos.

Com Gengis Khan seria um pouco diferente. Provavelmente por ser asiático e por não haver se aliado a uma estrutura de uma instituição como a de uma Igreja Católica. No seu Império ninguém dominava a escrita. O que se sabe é mais por relatos orais e lendas. Mesmo assim os registros existentes indicam que ele tinha seus xamãs de onde viam as informações que o ajudou a formular a estratégia para erguer o maior Império da terra feito por um único homem. É o que veremos a seguir.

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